Pe Luiz
Cláudio Azevedo de Mendonça
Assessor Eclesiástico da Pastoral da
Comunicação da Diocese de Nova Friburgo
Membro da
Academia Friburguense de Letras
Quero
ressaltar neste artigo o centenário de nascimento de D. Clemente Isnard,
,celebrado neste 8 de julho de 2017. Primeiro Bispo da Diocese de
Nova Friburgo que também foi ilustre membro de nossa Academia Friburguense de
Letras, honrando-a com a sua brilhante intelectualidade, ocupando a cadeira de
número 09, patronímica de Casimiro de Abreu.
DOM
CLEMENTE JOSÉ CARLOS ISNARD: grande e extraordinário homem, iluminado monge,
discípulo de S. Bento, notável bispo e ardoroso missionário da Igreja. Fui o
último padre ordenado por ele para a diocese de Nova Friburgo, em 14 de agosto
de 1993, em Macaé. Nasceu no dia 8 de julho de 1917, no Rio de Janeiro. Homem
autentico, suave e forte, como um verdadeiro apóstolo, determinado, com uma
formação espiritual sólida, integradora da realização e salvação da pessoa com
a libertação e promoção humana na luta pelo direito total. Teve ,na sua
educação cristã familiar, o exemplo de seus pais Ernesto e Zulmira Isnard, sua
tia Ruth Leoni, esposa do poeta Raul de Leoni Ramos, da sua outra tia Helena
Isnard que se tornou freira Redentorista, fundadora e superiora do convento de
Itu – SP, dentre outros. Assimilou conhecimentos e valores no Centro de
Estudos Superiores Católicos (D. Vital), presidido pelo Dr. Alceu Amoroso Lima,
seu amigo e incentivador vocacional; na Ação Universitária Católica, da qual
participava ativamente em 1932, como jovem da Faculdade de Direito, no Rio de
Janeiro, onde bacharelou-se. Mas, a sua grande e decisiva influencia mística,
litúrgica, teológica e humana que consolidou a sua vocação para a vida
monástica foi D. Martinho Michler, monge alemão, que, com sua visão de
vanguarda, impulsionava e alimentava o movimento litúrgico no Brasil. D.
Martinho se tornou o seu pai espiritual. Como monge se manteve sempre fiel ao
espírito e a regra Beneditina. Fez a sua profissão solene em 11 de julho 1940,
no dia do Pai S. Bento. Assumiu vários cargos de gestão e formação. Foi
ordenado sacerdote em 19/12/1942. Nomeado bispo no período preparatório ao
Concílio Vaticano II, pelo Santo Papa João XXIII, em 23 Abril de
1960 para a recém-criada Diocese de Nova Friburgo pela bula pontifícia
“Quandoquidem Verbis” de 26 de março do mesmo ano. Sua
ordenação episcopal foi no dia 25 de julho, no Mosteiro de S. Bento no Rio de
Janeiro, presidida pelo Núncio Apostólico do Brasil, na época, D. Armando
Lombardi. Tomou posse no dia 07 de agosto. Iniciava um fecundo
ministério, no pastoreio episcopal de tantas ovelhas, espalhadas pelo imenso
território de 10.000 km², desmembrado das Dioceses de Niterói, Campos e
Valença, e que se estenderia por 33 anos. Participou do Concílio Vaticano II
(l962-l965) que renovou toda a vida pastoral da Igreja Católica Apostólica
Romana. D. Clemente viu e ouviu com alegria a visão teológica e
eclesiológica da liturgia de D. Martinho, do movimento litúrgico e de outros
grandes teólogos no mundo inteiro ser confirmada, condensada, na Constituição
Sacrosanctum Concilium. Nomeado após o Concílio pelo
Papa Paulo VI para o Conselho de Execução da Constituição sobre a Sagrada
Liturgia Sacrosanctum Concilium (1964-1969) e depois como membro da Congregação
para o Culto Divino, órgão da Santa Sé responsável pela liturgia
(1969-1975). E no Brasil foi Presidente por dezenove anos da
Comissão Nacional de Liturgia da CNBB. Em todos os trabalhos
refletia os seus profundos conhecimentos, vastíssima cultura e grande erudição,
aliados à forte sensibilidade pastoral. Foi ainda vice-presidente da CNBB
(1979-1982), presidente do Departamento de Liturgia e vice-presidente do
CELAM-Conselho Episcopal da América Latina (1983-1987). Participou
do Sínodo dos Bispos de 1967 e das Conferências Latino-Americanas de Puebla
(1979) e Santo Domingo (1992). Delegado no Brasil para os Congressos
Eucarísticos Internacionais. Membro do Conselho Nacional de Cultura, do
Conselho Estadual de Educação, recebendo títulos de cidadania de vários
municípios, inclusive de Cidadão Fluminense. Mas, o grande título,
profundamente alinhado com o seu carisma de Bispo Beneditino, era Pastor de
Nova Friburgo. Não descuidava da diocese um só instante. Organizou
as diretrizes pastorais da Diocese, à luz do Concílio Vaticano II, trabalhando
com os conselhos que foi criando que teriam a função de elaborar o Plano de
Atividades Pastorais. As primeiras diretrizes foram lançadas em 11
de fevereiro de l969. Organizou ao todo quinze Assembleias Diocesanas a partir
de então, para a definição das metas pastorais, sempre publicadas junto com os
planos e divulgadas em toda a Diocese, criando uma unidade eclesial e
fomentando uma pastoral de conjunto.
Todo este
trabalho culminou no Sínodo Diocesano de 1991 que consolidou os Estatutos
Sinodais. A Diocese ia evoluindo. Novas paróquias sendo criadas. O
bispo zeloso conseguiu diversos auxílios de órgãos nacionais e internacionais
para as necessidades socioeclesiais, dentre estes, A ADVENIAT, desde l963, a
CÁRITAS, a MISEREOR, o FAC – Fraterno Auxílio Cristão. Fundou logo a Cáritas
Diocesana em 1960 com D. Maria Damasco Mouta e o Pré-seminário Vocacional em
Lumiar. A dificuldade de vocações sacerdotais era
grande. Até os 25 anos da Diocese, ordenara 14 padres. Ordenou mais
uma dezena até a sua saída e deixou encaminhados vários seminaristas, ordenados
depois. D. Clemente foi uma grande voz dos mais fracos, dos sem voz, contra as
injustiças e o duro e cruel regime da ditadura militar, defendendo os posseiros
em Papucaia ou a vida de refugiados e perseguidos políticos, recebendo-os na
casa episcopal e depois deslocando-os para Lumiar, com o apoio da professora
local e grande colaboradora D. Maria Mouta. Tudo isso D. Clemente fazia contra
os critérios sombrios da chamada “Lei de Segurança Nacional” que
atropelava os direitos humanos, civis e sociopolíticos. Assim também
em Trajano de Moraes, Cantagalo, Quissamã, em diversos municípios da Diocese. O
efeito de tanto bem plantado circula até hoje nas veias e na memória de um povo
numerosíssimo, sempre capaz na sua simplicidade santa, da belíssima virtude da
gratidão. Deixou como obras de testemunho e ensinamento: Magistério Episcopal
(1989); Dom Martinho (1999); Na Porta do Mosteiro (entrevista com Alexandre
Gazé, 2004; Reflexões de um Bispo sobre as Instituições Eclesiásticas (2008);
Viver a Liturgia (2008); A Experiência Ensina o Bispo (2009); Memórias que
Anunciam o Futuro ( Póstuma -2012), além de inúmeros artigos em jornais e
revistas eclesiásticas. Faleceu aos noventa e quatro anos em Recife, no dia 24
de agosto de 2011, terminando sua riquíssima jornada, deixando-nos um
maravilhoso legado de sábia fortaleza, de humildade e formação eclesial, de
luta pelos direitos humanos, promoção humana e justiça social, dedicação e
organização da sua querida Messe de Nova Friburgo iluminando tantas outras
porções da Igreja no Brasil e no mundo, na sua firme e
brilhante vivência e preservação do Concílio Vaticano II. Fez sua
Páscoa no dia do apóstolo S. Bartolomeu, ele um digníssimo sucessor dos
apóstolos que percorreu com o seu báculo todos os recantos da extensa e amada
seara diocesana como caridoso e despojado guia, exemplo eterno de doação,
sabedoria e amor pastoral. Cumpriu plenamente o seu lema episcopal: "Te
Pastorem Sequens" (Seguindo-te como Pastor). Seguiu a Cristo, sendo ao
mesmo tempo n'Ele o Bom Pastor que deu sua vida pelas ovelhas. Fica o seu
grande testemunho entre nós de um Pastor, que amou os pobres e promoveu-os como
filhos de Deus, nossos irmãos, de uma voz profética inequívoca e coerente que
nos inspira. Sua importância é imensa, condensada na sua autentica humildade e
na sua evangélica simplicidade, ardoroso na Missão de Cristo que ele tanto amou
e da qual foi servo até o último suspiro.
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